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GT Aracaju-Barra dos Coqueiros do OSR define encaminhamentos em defesa dos territórios tradicionais

“A gente sente muita saudade das nossas reuniões presenciais, do licor de mangaba, das frutas que as pessoas levavam, do cafezinho bom em tudo que é lugar que nós íamos. Mas a pandemia haverá de passar e os abraços irão retornar”.

Foi com essas palavras que a professora Christiane Campos, uma das coordenadoras do PEAC, abriu a reunião do Grupo de Trabalho Aracaju/Barra dos Coqueiros do Observatório Social dos Royalties, realizada na tarde deste sábado, 13/03.

Em respeito às recomendações das autoridades de saúde pública, a reunião – assim como todas as atividades do PEAC desde o início da pandemia – aconteceu de forma remota, possibilitada pelos créditos celulares fornecidos pelo programa.

Mas se o grave momento que o país atravessa exige distanciamento físico, permanece a proximidade na defesa dos territórios tradicionais e dos povos e comunidades que neles vivem.

E a reunião do GT Aracaju/Barra evidenciou que são muitos os desafios na garantia dos direitos desses grupos e na perspectiva da justiça socioambiental.

“Estamos passando um momento muito pesado. O auxilio emergencial foi cortado, ninguém aqui ainda foi vacinado. Enquanto tiver essa pandemia, se tiver melhoria vai ser bem pouca. Mal saímos do problema do petróleo, chegou o problema do coronavírus”, disse Robério Manoel da Silva, do quilombo Pontal da Barra, na Barra dos Coqueiros, e presidente da associação comunitária.

A lembrança que Robério faz do derramamento de petróleo ecoa também na voz de José Reis, pescador da Coroa do Meio, em Aracaju. “A gente ficou sem pescar, ficamos sem vender o peixe. Nem todo mundo recebeu o pagamento pelo petróleo. Também nem todos receberam o auxílio do governo e agora sabemos que talvez só no mês que vem. É um momento difícil que estamos passando”, disse.

Situação parecida é descrita por Jil Santos, marisqueira do Mosqueiro: “além de não ter marisco e não ter pescado, o que a gente consegue pescar é pra comer. Não recebemos o recurso do petróleo, não temos auxílio emergencial. Pra não passar fome, a gente vai pra maré e come o que pesca”.

Outro relato que não deixa dúvidas sobre o aprofundamento das desigualdades na pandemia é o de Uilson de Sá, Presidente da Associação de Catadoras e Catadores de Mangaba Padre Luiz Lemper, em Aracaju. “Os problemas são enormes. O auxílio foi suspenso e dificultou pra muita gente. Coisas básicas estão faltando. Eu estou com pessoas passando necessidade”, denuncia.

A semelhança dos depoimentos de integrantes das comunidades não é por acaso. Informações do monitoramento realizado pelo PEAC entre junho e outubro de 2020, socializadas na reunião, revelam a precariedade das condições de saúde, de acesso à água e internet nas comunidades costeiras, além do recrudescimento dos conflitos territoriais. a situação de vulnerabilidade socioeconômica a que esses territórios estão submetidos recrudesceu durante a pandemia de covid-19.

A engenheira Marina Bezerra, que desenvolve trabalho voluntário na Associação das Catadoras e Catadores de Mangaba da Barra dos Coqueiros, avalia que “o cerco tem se fechado para as comunidades da nossa região pelos projetos imobiliários e industriais que ameaçam os modos de vida”.

 

Se os problemas são coletivos, as saídas também são

Ao analisar o contexto de agravamento das violações de direitos e de negligência estatal, as comunidades ressaltaram também que as alternativas encontradas têm sido baseadas na solidariedade entre os próprios territórios.

“Ajudamos uns aos outros como podemos. Passamos dificuldades, mas seguimos”, afirmou Jil Santos, marisqueira do Mosqueiro.

“A comunidade se vira como pode. Um vai contribuindo com o outro”, comentou Aníbal Moura, do povoado Touro, na Barra dos Coqueiros.

“Esse é o momento que a gente deve olhar pro outro, estar atento ao outro e respeitar o espaço do outro, ao mesmo tempo. Nós nos ajudamos, mas não é suficiente. Por isso que é importante o auxílio governamental”, disse Ítalo Dantas, da comunidade Barroso, em Aracaju.

O enfatizado por Ítalo sobre o papel do poder público na garantia dos direitos dos povos e comunidades tradicionais foi apontada na reunião sob duas perspectivas principais neste momento: a necessidade de retorno do auxílio emergencial e a destinação de parte dos royalties dos municípios para as famílias mais afetadas pela pandemia.

A respeito especificamente dos royalties, foram apresentados números que demonstram queda na arrecadação, entre janeiro e dezembro de 2020, pelos municípios de Aracaju (de quase R$ 1 milhão para pouco mais de R$ 227 mil em) e Barra dos Coqueiros (de quase R$ 872 mil para pouco mais de R$ 603 mil).

Apesar da redução, vale frisar, os recursos permanecem elevados e poderiam ser utilizados para amenizar o sofrimento das comunidades costeiras desses municípios.

Neste sentido, os/as participantes da reunião definiram pela elaboração e envio de ofício às Câmaras de Vereadores das duas cidades para solicitar informações sobre destinação dos recursos dos royalties e apresentar a possibilidade de utilização de percentuais para apoio às comunidades.

Outro encaminhamento da reunião foi a continuidade e intensificação dos materiais de comunicação do PEAC, a exemplo do Canal do Mangue e do Informativo OSR, que foram bem avaliados pelas comunidades.

Além das pessoas de comunidades abrangidas pelo PEAC e mencionadas no texto, participaram da reunião dona Margareth e Robson Valido, do povoado Jatobá, na Barra dos Coqueiros; e Adilma Gomes, da comunidade Barroso, na Farolândia, em Aracaju.