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Mais de 15 impactos ambientais aos territórios pesqueiros foram denunciados ontem, 31, por pescadores e marisqueiras presentes na Plenária dos Povos. Como parte da programação do segundo dia do XIII EPEAC, a plenária com o tema “Lutas por terra e território: anúncios, denúncias e resistência” reuniu dezenas de participantes que discutiram os problemas e ameaças enfrentadas nas diferentes comunidades.
Facilitação gráfica realizada por Yule Neves, Muriel Pereira, Mariana Pardo, Rosely Camila e Eduarda Vitória
A plenária contou com a participação das lideranças Izaltina Silva, do Fórum de Povos e Comunidades Tradicionais de Sergipe; Wellington Quilombola do Quilombo Porto D’Areia; Uine Lopes, representante da juventude do Movimento de Pescadores e Pescadoras (MPP) de Ilha de Maré; Ivanildes Pereira, indígena Guarani Myba representante do Fórum de Povos e Comunidades de Paraty, Angra dos Reis e Ubatuba; Carlos Alberto, liderança da Reserva Extrativista de Canavieiras; Ana Elisa, liderança do Movimento de Marisqueiras de Sergipe (MMS); Maria das Dores, representante do Observatório Social dos Royalties (OSR) e Gesiani Souza Leite, liderança da Reserva Extrativista de Canavieiras.
Durante a Plenária dos Povos as lideranças compartilharam análises de conjuntura sobre seus territórios e apontaram a presença de impactos em diferentes locais pesqueiros. Dentre os diversos problemas, a carcinicultura, a especulação imobiliária, o cercamento das águas e portos artesanais, a poluição e destruição de manguezais e a instalação de petrolíferas foram os impactos mais alarmantes denunciados na plenária. Segundo Ana Elisa, liderança do Movimento de Marisqueiras de Sergipe (MMS), embora os territórios sejam distintos, os problemas parecem ser os mesmos.
“Meu pai e minha mãe contam sobre as mesmas lutas e vemos que nada melhorou. Temos muitos problemas com os portos fechados, com os empreendimentos e a carcinicultura que devastam os nossos manguezais. Já fizemos diversas denúncias ao MPF, mas nada foi feito até agora. Nós que somos marisqueiras passamos por problemas quando vamos ao médico e não temos um atendimento adequado. Quando a gente faz intercâmbio, o que percebemos é que o território muda, mas as problemáticas são as mesmas”, explica Ana Elisa que também é presidente da Associação de Moradores de Terra Caída, em Indiaroba.
Já em Ilha de Maré, na Bahia, a forte presença da exploração de petróleo e de complexo industrial ameaçam a vida da população tradicional. Segundo Uine Lopes, liderança da juventude do MPP, uma pesquisa recente desenvolvida pelo departamento de Nutrição da Universidade Federal da Bahia (UFBA) encontrou a presença de chumbo em crianças da Ilha de Maré. “O racismo ambiental e estrutural é uma das principais ameaças que enfrentamos na Ilha de Maré. A destruição dos manguezais da região e a contaminação dessas áreas têm gerado inúmeras preocupações à comunidade. Estamos perdendo pessoas no território decorrente da contaminação vinda do setor industrial. Pensar no futuro hoje nos traz muitas preocupações”, desabafa.
Uine Lopes, pescador e liderança da Juventude de Ilha de Maré | Esdras Amaro
Para Ivanildes Pereira, indígena Guarani Myba e representante do Fórum de Comunidades e Povos Tradicionais de Paraty, a luta secular dos territórios indígenas é uma luta em defesa do Bem-Viver. “A nossa luta tem mais de 500 anos, o modo de ser é aquilo que herdamos do nosso povo. A nossa terra é todo o território onde a gente vive e cultiva a cultura e a tradição. Os grandes empreendimentos e a exploração de petróleo têm ameaçado nosso Bem-viver e nossas comunidades e por isso precisamos fortalecer nossas redes de luta para fazer o enfrentamento a essas questões”, propõe.
Carlos Alberto, liderança da Reserva Extrativista de Canavieiras no sul da Bahia, apontou as Unidades de Conservação e Reservas Extrativistas como políticas de defesas dos territórios que podem contribuir com a luta das comunidades tradicionais. “Precisamos fortalecer as redes de povos e comunidades tradicionais do Brasil e apontar novos caminhos e modos para viver neste planeta. Também devemos ocupar as associações e conselhos nos nossos municípios e estados para fazermos a disputa das políticas de defesa dos territórios. Essa é uma luta que pode não resultar em conquistas imediatas, mas os frutos serão colhidos pelas próximas gerações”, afirma.
Direitos territoriais para quem?
A mesa de debate realizada à tarde sobre o tema “Direitos territoriais para quem?” contou com a participação de representantes do Ibama e da Secretaria de Patrimônio da União que dissertaram sobre os principais temas discutidos na plenária dos povos.
Representantes do Ibama e SPU respondem a questionamentos de lideranças comunitárias | Esdras Amaro
Composta por Cecília Barbosa e Cássio Murilo, representantes do Ibama Nacional e o Ibama Sergipe, respectivamente, e por Nielson Torres, Celso Carvalho e Cleide Lúcia, representantes da SPU Sergipe, SPU Nacional e SPU Brasília (na ordem), a mesa possibilitou que diferentes lideranças questionassem os órgãos presentes, exigindo celeridade na resolução de problemas.
Neverton Cruz, conselheiro do Conselho Gestor e morador de São Cristóvão, foi uma das lideranças que exigiu maior fiscalização dos órgãos federais e estadual. “São Cristóvão é rico em fontes naturais e nós estamos perdendo nossas fontes ancestrais, porque a cerca vem e impede a gente que é pescador e marisqueira de ter acesso. Lá também tem um empreendimento que criou uma grande área de areal que está desertificando nossa comunidade. Eu venho fortalecer esse pedido, é preciso uma fiscalização mais eficiente e um retorno a nós do Conselho Gestor para que a gente leve as informações para as nossas comunidades”, explica.
Noite cultural com lançamento de discos
Porta-bandeira da Escola de Samba União Quilombola por Sergipe | Esdras Amaro
Para finalizar as atividades do segundo dia do EPEAC, a noite cultural contou com o lançamento dos discos “Tambores da Resistência” e “Raízes Quilombolas do Porto D’Areia”, uma realização do PEAC em parceria com os grupos Axé Afro, Quilombatuque, Maracatu de Brejão dos Negros, Batucada de Improviso do Porto D’Areia e a Escola de Samba União Quilombola por Sergipe.
Para Florisvaldo Rocha, coordenador pedagógico do Núcleo de Educomunicação do PEAC, a noite de ontem foi um momento histórico. “É uma vitória para nós, é uma alegria que é de fato ver o povo dançando e cantando, o povo precisa ver o povo cantar e essa é a visão do PEAC ao apoiar esses grupos para se manifestarem e fazer essa arte para que o futuro possa conhecer, reviver e reproduzir, então é uma alegria muito grande”, explica.
Florisvaldo Rocha, coordenador do Núcleo de Educomunicação fala sobre o lançamento dos discos | Esdras Amaro
Ao som da batucada e dos tamancos do Porto D’Areia e de Brejo Grande, a noite cultural embalou a dança e o ritmo dos participantes do EPEAC. Emocionado, Welligton Quilombola, lançou ao vento palavras de sonho e esperança. “Meu sonho é ver cada grupo cultural de cada comunidade tradicional de Sergipe mostrando seu trabalho em eventos como esse. Essa noite foi muito linda, com muita sabedoria, com muita cultura e tradição e isso me emociona muito. É isso que desejo e sonho”.
O Programa de Educação Ambiental com Comunidades Costeiras (PEAC) incentiva o fortalecimento dos Territórios de vida dos Povos e Comunidades Tradicionais. A realização do PEAC é uma exigência do licenciamento ambiental federal, conduzido pelo Ibama.