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Povos e Comunidades Tradicionais de Sergipe se reúnem para discutir Zoneamento Costeiro do Litoral Norte

  • 21-07-2022

Encontro teve objetivo de articular lideranças para participar da Audiência Pública que será realizada no dia 26 de julho em Pacatuba-SE.

Pescadoras e pescadores, quilombolas, extrativistas da mangaba e de mariscos, camponeses e outros Povos e Comunidades Tradicionais de Sergipe têm participado intensamente da construção da Política Estadual de Gerenciamento Costeiro, uma política pública de planejamento territorial e ambiental dos municípios costeiros de Sergipe. 

Parte importante dessa política é o Zoneamento Ecológico Econômico Costeiro, que foi aprovado em formato de lei no litoral sul do estado e na próxima terça-feira (26) terá a versão do litoral norte discutida em audiência pública no Centro Municipal de Pacatuba-SE. O Zoneamento busca estabelecer zonas e instrumentos de gestão para a ocupação  dos espaços costeiros e seus processos legais de licenciamento e exploração econômica. Basicamente, é um documento que dirá o que pode e o que não pode ser feito em cada pedaço da costa de Sergipe.

Tal instrumento deveria ter como objetivo garantir um ordenamento territorial direcionando o desenvolvimento sustentável na preservação e recuperação dos recursos naturais  e  na proteção aos modos de vida das populações tradicionais do estado. Entretanto, o que tem se presenciado é um processo cujo objetivo tem sido a garantia dos interesses de grandes empreendimentos capitalistas dentro dos territórios dos Povos e Comunidades Tradicionais, promovendo a destruição dos mangues, dos rios, mar e terra. 

Para discutir sua participação e intervenção na audiência, representantes comunitários de nove municípios da costa sergipana se reuniram no dia 19 de julho em Brejo Grande-SE com a equipe técnica do Programa de Educação com Comunidades Costeiras (PEAC), o Comitê São Franscisco Vivo, lideranças de movimentos sociais e deputado estadual.

De acordo com as comunidades, é comum os governos realizarem audiências sem ouvir de fato as considerações e reivindicações da população. “Não é só trazer a proposta e a gente aceitar. Tem que discutir, pois nós temos direito de ser ouvidos e também de questionar as propostas no que atinge a nós Povos e Comunidades Tradicionais”, enfatiza Robério Manoel da Silva, pescador e liderança quilombola de Pontal da Barra, em Barra dos Coqueiros-SE.

Na reunião foi apresentado o mapa do litoral norte e feita a discussão sobre as zonas, em especial a Zona de Proteção Ambiental e a Zona de Uso Diversificado. “Esse encontro é um momento importante porque, apesar do conhecimento que a gente tem de luta, esse é mais um alerta para que a gente possa estar preparado, porque tinha pontos do Zoneamento Costeiro que a gente ainda não conhecia. Então essa reunião vem nos fortalecer; vem nos deixar preparados para enfrentar o debate no dia da audiência”, destaca o pescador Clesivaldo, do território quilombola Brejão dos Negros.

O futuro é ancestral

Em cada espaço de discussão do Gerenciamento Costeiro (Gerco) as especificidades das comunidades tradicionais são frisadas. Além de possuírem modos de vida diversos que se assentam no trabalho familiar e comunitário com o objetivo de reproduzir uma coletividade, elas são as guardiãs de áreas naturais que são preservadas e recuperadas pelo seu trabalho.

“É dessa natureza que essas populações reconhecem e encontram sua ancestralidade, aquela que está desde antes do processo de invasão do território brasieliro”, demarca o professor e pesquisador da Universidade Federal de Sergipe (UFS) Eraldo Ramos, que atua como coordenador geral do PEAC.

Eraldo defende que as políticas ambientais e territoriais devem ser conduzidas pela dinâmica das populações tradicionais, pois são elas que constroem políticas públicas no dia a dia como forma de re-existência. 

“O encontro de diferentes comunidades permite articular formas de produção dos territórios com a política pública profunda de construção do Brasil que atravessa o tempo desde antes da constituição do país até os dias de hoje e sinaliza para gente uma perspectiva de futuro”, explica.

Intercâmbios de saberes

Para Eraldo, participar da atividade também é fortalecer o intercâmbio de experiências entre os Povos e Comunidades Tradicionais e a UFS. “Na condição de pesquisador que atua com o ensino, a pesquisa e a extensão na universidade, vejo que esses espaços nos retroalimentam, nos trazem um grande aprendizado e isso contribui para que a gente construa uma universidade pública mais próxima e comprometida com os problemas reais da sociedade brasileira”.

Já Daniela Bento, representante do Conselho Pastoral de Pescadoras e Pescadores (CPP) e integrante da Articulação do Semiárido (ASA), afirma que sua trajetória junto aos movimentos populares esteja muito ligada às lutas no campo nas regiões semiáridas - onde os maiores desafios são a não concentração de águas e de terras -, e as lutas dos povos ribeirinhos trazem novas questões, como o direito à água além do usufruto, mas também como um direito de ir e vir, e a disputa pelo modelo de produção nessas comunidades cobiçadas por megaempreendimentos.

“Este é um espaço novo para mim, mas não é um espaço de estranhamento no sentido do que seja a defesa dos direitos das comunidades e dos territórios e, como eu tenho dito, todas as lutas estão ligadas aos Direitos Humanos”, aponta Daniela.

O intercâmbio com a região semiárida é uma potência no compartilhamento das tecnologias sociais, a exemplo da construção de cisternas para armazenar água das chuvas, já que embora façam parte do litoral, muitas comunidades costeiras não têm acesso à água potável. “São tecnologias sociais muito fáceis de serem compartilhadas, afinal, quintal e telhado toda casa tem”, brinca.

 

Programa Peac

O Programa de Educação Ambiental com Comunidades Costeiras (PEAC) incentiva o fortalecimento dos Territórios de vida dos Povos e Comunidades Tradicionais. A realização do PEAC é uma exigência do licenciamento ambiental federal, conduzido pelo Ibama.