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Encontro teve objetivo de articular lideranças para participar da Audiência Pública que será realizada no dia 26 de julho em Pacatuba-SE.
Pescadoras e pescadores, quilombolas, extrativistas da mangaba e de mariscos, camponeses e outros Povos e Comunidades Tradicionais de Sergipe têm participado intensamente da construção da Política Estadual de Gerenciamento Costeiro, uma política pública de planejamento territorial e ambiental dos municípios costeiros de Sergipe.
Parte importante dessa política é o Zoneamento Ecológico Econômico Costeiro, que foi aprovado em formato de lei no litoral sul do estado e na próxima terça-feira (26) terá a versão do litoral norte discutida em audiência pública no Centro Municipal de Pacatuba-SE. O Zoneamento busca estabelecer zonas e instrumentos de gestão para a ocupação dos espaços costeiros e seus processos legais de licenciamento e exploração econômica. Basicamente, é um documento que dirá o que pode e o que não pode ser feito em cada pedaço da costa de Sergipe.
Tal instrumento deveria ter como objetivo garantir um ordenamento territorial direcionando o desenvolvimento sustentável na preservação e recuperação dos recursos naturais e na proteção aos modos de vida das populações tradicionais do estado. Entretanto, o que tem se presenciado é um processo cujo objetivo tem sido a garantia dos interesses de grandes empreendimentos capitalistas dentro dos territórios dos Povos e Comunidades Tradicionais, promovendo a destruição dos mangues, dos rios, mar e terra.
Para discutir sua participação e intervenção na audiência, representantes comunitários de nove municípios da costa sergipana se reuniram no dia 19 de julho em Brejo Grande-SE com a equipe técnica do Programa de Educação com Comunidades Costeiras (PEAC), o Comitê São Franscisco Vivo, lideranças de movimentos sociais e deputado estadual.
De acordo com as comunidades, é comum os governos realizarem audiências sem ouvir de fato as considerações e reivindicações da população. “Não é só trazer a proposta e a gente aceitar. Tem que discutir, pois nós temos direito de ser ouvidos e também de questionar as propostas no que atinge a nós Povos e Comunidades Tradicionais”, enfatiza Robério Manoel da Silva, pescador e liderança quilombola de Pontal da Barra, em Barra dos Coqueiros-SE.
Na reunião foi apresentado o mapa do litoral norte e feita a discussão sobre as zonas, em especial a Zona de Proteção Ambiental e a Zona de Uso Diversificado. “Esse encontro é um momento importante porque, apesar do conhecimento que a gente tem de luta, esse é mais um alerta para que a gente possa estar preparado, porque tinha pontos do Zoneamento Costeiro que a gente ainda não conhecia. Então essa reunião vem nos fortalecer; vem nos deixar preparados para enfrentar o debate no dia da audiência”, destaca o pescador Clesivaldo, do território quilombola Brejão dos Negros.
Em cada espaço de discussão do Gerenciamento Costeiro (Gerco) as especificidades das comunidades tradicionais são frisadas. Além de possuírem modos de vida diversos que se assentam no trabalho familiar e comunitário com o objetivo de reproduzir uma coletividade, elas são as guardiãs de áreas naturais que são preservadas e recuperadas pelo seu trabalho.
“É dessa natureza que essas populações reconhecem e encontram sua ancestralidade, aquela que está desde antes do processo de invasão do território brasieliro”, demarca o professor e pesquisador da Universidade Federal de Sergipe (UFS) Eraldo Ramos, que atua como coordenador geral do PEAC.
Eraldo defende que as políticas ambientais e territoriais devem ser conduzidas pela dinâmica das populações tradicionais, pois são elas que constroem políticas públicas no dia a dia como forma de re-existência.
“O encontro de diferentes comunidades permite articular formas de produção dos territórios com a política pública profunda de construção do Brasil que atravessa o tempo desde antes da constituição do país até os dias de hoje e sinaliza para gente uma perspectiva de futuro”, explica.
Para Eraldo, participar da atividade também é fortalecer o intercâmbio de experiências entre os Povos e Comunidades Tradicionais e a UFS. “Na condição de pesquisador que atua com o ensino, a pesquisa e a extensão na universidade, vejo que esses espaços nos retroalimentam, nos trazem um grande aprendizado e isso contribui para que a gente construa uma universidade pública mais próxima e comprometida com os problemas reais da sociedade brasileira”.
Já Daniela Bento, representante do Conselho Pastoral de Pescadoras e Pescadores (CPP) e integrante da Articulação do Semiárido (ASA), afirma que sua trajetória junto aos movimentos populares esteja muito ligada às lutas no campo nas regiões semiáridas - onde os maiores desafios são a não concentração de águas e de terras -, e as lutas dos povos ribeirinhos trazem novas questões, como o direito à água além do usufruto, mas também como um direito de ir e vir, e a disputa pelo modelo de produção nessas comunidades cobiçadas por megaempreendimentos.
“Este é um espaço novo para mim, mas não é um espaço de estranhamento no sentido do que seja a defesa dos direitos das comunidades e dos territórios e, como eu tenho dito, todas as lutas estão ligadas aos Direitos Humanos”, aponta Daniela.
O intercâmbio com a região semiárida é uma potência no compartilhamento das tecnologias sociais, a exemplo da construção de cisternas para armazenar água das chuvas, já que embora façam parte do litoral, muitas comunidades costeiras não têm acesso à água potável. “São tecnologias sociais muito fáceis de serem compartilhadas, afinal, quintal e telhado toda casa tem”, brinca.
O Programa de Educação Ambiental com Comunidades Costeiras (PEAC) incentiva o fortalecimento dos Territórios de vida dos Povos e Comunidades Tradicionais. A realização do PEAC é uma exigência do licenciamento ambiental federal, conduzido pelo Ibama.